Tiro Ioiô
por Iberê Mariano da Silva
Na época em que cheguei em Manaus, (1970), havia uma espécie de diretriz, que todos Oficiais que viajavam muito a serviço, deviam fazer o Curso de Guerra na Selva.
Eu por força de apoiar todas OMs da Região Amazônica, fui matriculado, como voluntário, no Curso.
Este foi muito interessante e cheio de passagens inesquecíveis.
O CIGS (Centro de Instrução de Guerra na Selva), em 1970, mudou de nome para COSAC (Centro de Operações na Selva e Ações de Comando).
Temos no Exército alguns inventores de nomes, que estão sempre inconformados com nomes antigos.
Devido a novas funções, chegaram a Manaus os Capitães Aldo, Valporto e Rebelo para organizar o Curso de Comandos de Selva.
Por eu pertencer a uma Unidade de apoio, ter muito material disponível e agora ser “guerreiro de selva GS 563”, me pediram apoio.
Começamos a testar todo tipo de armamento na floresta e nos rios.
Obus 105 e morteiro 81 sobre chatas, lança rojão, lança-chamas, granadas, arco e flecha, besta, facas de combate, e o que você imaginar.
Mas, como é quase norma, um acidente estava fadado a acontecer.
Estávamos testando o tiro de morteiro 60 mm na selva.
O tiro é inverso do normal.
Você acha um furo nas folhagens e galhos lá no alto, de tal forma que você veja o céu.
Aí você posiciona o morteiro já com a inclinação desejada, de tal forma que a trajetória passe pelo furo.
Complexo, mas funciona, principalmente se tiver um aparelho de pontaria de boca apropriado.
Não tínhamos, pois ainda nós não o havíamos inventado.
Os três primeiros tiros foram uma beleza.
No quarto, nos descuidamos da verificação, e a granada bateu num galho no alto de uma árvore e voltou, tal e qual tiro ioiô.
Nos jogamos no chão, de tal forma que, entre o corpo e o solo não passava nem pensamento.
A granada explodiu.
O tempo passou a uma velocidade extraordinariamente lenta.
Primeiro mexíamos um dedo, com um medo de não ser possível.
Depois, lentamente outro, e mais outro.
Puxamos uma perna, sempre com medo de não ser possível.
Depois, a outra.
Em seguida mexer a cabeça e abrir os olhos.
Os ouvidos ainda zumbiam devido ao barulho.
Após nos checarmos e ainda grudados no chão, começamos a chamar os outros, baixinho, com medo que não respondessem.
Aumentamos o volume e, após confirmarmos que todos estavam vivos e bem, é que nos estimulamos a descolar do chão.
Após, eufóricos nos abraçamos e pulamos de alegria, enquanto verificávamos os estilhaços cravados nas árvores e a cratera que ficara no chão.
Gen Bda Eng Mil Veterano Iberê Mariano da Silva – Engenheiro Eletrônico e Nuclear – AMAN – CPEAEX — Turma 1967 – Material Bélico